Relato da Lívia:
Meu VBA2C
A Melissa é minha terceira filha.
Quando engravidei pela primeira
vez, não me preparei para um parto normal. Eu nem sabia que precisava disso!
Para mim esse era o desfecho natural de toda gravidez saudável. Na época eu
ainda acreditava que cesárea fosse para quem precisasse ou no máximo, quem
escolhesse; e esta não era uma opção pessoal. Com 37 semanas, o último
ultrassom mostrou meu bebê sentado: bebê pélvico nasce de cesárea. A segunda cesárea
foi por repetição: uma vez cesárea sempre cesárea.
O terceiro filho era um desejo. Pesquisei,
li e estudei muito sobre parto normal após cesárea. Assisti documentários, vi
muitos partos no youtube e li muitos relatos. Todos me emocionavam. Chorei
muito assistindo vídeos de partos naturais/humanizados. Chorava de emoção, mas
também pela dor que tomava meu coração por não ter vivido um momento assim com meus
bebês!
Engravidei! Viva!!
Já sabia que eu queria uma equipe
humanizada. Mais que um parto vaginal eu queria um parto com respeito. Comecei
o pré-natal super empolgada. Minhas gestações são muito tranquilas, tudo dentro
do padrão, e só duas questões me preocupavam: a placenta e o SIAPARTO. Fui
diagnosticada precocemente com placenta baixa. Como meu caso tinha fatores de
risco aumentado, me preocupei bastante. Já o SIAPARTO coincidia com a minha 40ª
semana de gestação e as minhas obstetras estariam lá!
Com 30 semanas a placenta estava
instalada favoravelmente ao parto normal e deixou de ser uma preocupação. Com o
SIAPARTO se aproximando eu precisava de um plano B, caso minha gestação se
estendesse. Encontramos outro médico que ficaria em Uberlândia e que topou me
atender. Sinceramente, eu tinha tanta confiança e convicção que daria certo que
cogitei até com plantonista. Com tudo resolvido era só esperar o grande dia.
Ele chegou com 39+4 semanas na
noite do dia 24/05/2015 sem rodeios. Era um domingo especial espiritualmente
falando para mim. Fiz tudo que deveria ter feito durante o dia e a noite, fui a
Igreja. Apesar de estar super bem e animada, durante o culto, comecei a sentir
um desconforto na lombar. Com todo o peso e a barriga enorme não dei muita
importância. Cheguei à casa da minha mãe por volta de 21h e li uma mensagem da
Juliana (uma amiga e apoiadora da causa) perguntando se tinha algum sinal. Respondi
que nada ainda. Logo em seguida, senti uma pontada na barriga como se fosse um
espasmo. Passou rápido e então fui para o quarto. Quando sentei na cama senti
um liquido escorrer. Primeiro, pensei que fosse xixi. Fui ao banheiro e
esvaziei a bexiga; quando levantei houve um novo “vazamento”. Avisei minha mãe
e ela logo falou: - É a bolsa! Um misto de emoção e ansiedade tomou conta de
mim! Fiquei com medo de acreditar e ser um “alarme falso”. Pedi pra minha mãe
um absorvente para “vigiar” o líquido. Estava clarinho, límpido e inodoro e os
vazamentos continuavam pouco a pouco. Enquanto isso minha mãe preparava o
jantar.
Eu me preparei
para esse dia!! Queria aproveitar tudo!!
Imaginei que passaria a madrugada em trabalho de parto e fui jantar;
parecia que eu estava com medo de passar fome! Jantei e as dores começaram;
senti uma contração bem dolorida e meu corpo tremeu como se eu estivesse com
muito frio. Por volta de 22h30 avisei a Kelly, minha doula, que a bolsa tinha
rompido e ela me orientou descansar, tentar dormir, ficar calma, chá de
camomila e chuveiro. E é claro que eu segui o script. Pensei que teria uma
noite de bajulação com a Kelly, meu esposo e minha mãe cuidando de mim.
Cheguei em casa
por volta de 23h e avisei a Dra Silvia, minha obstetra. Fui para o chuveiro com
contrações já bem doloridas e bem próximas uma das outras. Minha filha mais
velha me acompanhou para tentar cronometrá-las. Estavam com menos de 5 minutos
e duravam mais de 40 segundos. Saí do chuveiro, tentei deitar na cama e fiquei uns
15 segundos; levantei e esmurrei meu colchão nessa hora de tanta dor.
Enquanto isso,
minha mãe falava para irmos para o hospital, que meu TP estava avançado. Mas eu
não acreditava...achava que demoraria mais. 10cm precisa de tempo!! Comecei a
sentir enjoos e coloquei pra fora todo meu jantar. Liguei pra Silvia pra contar
como eu estava e ela sugeriu que fossemos para o hospital. Quando estava com
ela no telefone tive o primeiro sangramento. Liguei pra Kelly e falei pra ela
que estava indo para o hospital por orientação da Silvia para ela ir também.
Minha ligação para a Kelly foi as 23h53. Pegamos as malas e fomos para o
hospital. Nesse horário não tinha trânsito e foi super tranquilo e rápido
chegar no Santa Clara.
Quando cheguei
a Silvia já estava lá. Me abraçou gostoso e fomos para o consultório do pronto
socorro para ela me examinar. Eu sentia muita dor nessa hora. Ela com toda
calma e paciência me disse que quando eu estivesse preparada ela faria um exame
para sabermos o andamento do TP. Quando consegui, sentei na banqueta, ela
examinou e me disse: - Você está com 9cm! Hã? O que?? Já?? Como assim?? Então
eu já posso falar para que eu inventei isso?? Nesse momento eu sentia muita
dor, mas o que incomodava mesmo era a vontade de fazer o número 2..rsrs
O enfermeiro
chegou com uma cadeira de rodas e eu não quis sentar. Era impossível. Preferi
ir caminhando até o centro cirúrgico e uma enfermeira me acompanhou. O hospital
estava em silêncio; não havia movimento naquele momento. Passamos na sala de
pré-parto para colocarmos as roupas. Meu marido entrou logo em seguida.
As enfermeiras
prepararam o centro cirúrgico. Arredaram a maca, jogaram um lençol no chão e
deixaram alguns a nossa disposição.
Durante as
contrações fiquei a maior parte do tempo em pé. Mexer o quadril aliviava
bastante, e no momento da contração eu agarrava meu esposo. Agarrava e
dependurava no pescoço dele. A Silvia foi falar com o pediatra de plantão,
porque não daria tempo de chamar o que eu queria. Tive uma grata surpresa em saber que o
pediatra de plantão daquela noite era o neonatologista que eu queria e pediatra
das minhas filhas mais velhas!! Eu não havia conversado com ele sobre a
humanização do nascimento, e acho ele até muito conservador para isso, então
deixei pra falar no parto mesmo, o que eu queria e o que eu não queria. De todo jeito eu confio e gosto do jeito
dele!! Ele chegou na porta do centro cirúrgico e pela janela de vidro eu pude
vê-lo. Chamei-o para entrar, mas ele preferiu ficar esperando de fora; mandei
um beijo pra ele nessa hora...
A Kelly também
chegou. Quando a vi na porta do centro cirúrgico com uma bola de pilates só
pensei uma coisa: como foi que ela conseguiu entrar aqui com essa bola desse
tamanho? (A Maternidade é bem conservadora). Fiquei muito feliz em vê-la,
afinal a equipe estava completa. A Sala
estava à meia luz, temperatura ambiente e uma música bem suave ao fundo. As músicas eram as mesmas que passei a
gravidez ouvindo. Tudo preparado com cuidado pela Kelly, já que eu e meu esposo
já não pensávamos em mais nada nesse momento. A Kelly fazia massagens na minha lombar e
pressionava meu quadril para ajudar a aliviar as dores. A bola de pilates eu
não usei. Quando senti vontade, sentei na banqueta.
Foi tudo muito
rápido e intenso. Meu marido se posicionou na minha frente e quando sentia
contração me apoiava nele. A Silvia fez uma ausculta e estava tudo bem com o
bebê. Outras contrações e a Melissa se aproximava cada vez mais. Agarrava meu
marido. Vocalizava. Em uma das contrações me lembro de ele e a Kelly pedir para
eu respirar. Respirei fundo. Coroou. A Silvia me perguntou se eu queria por a
mão e eu não quis. Fiquei com medo de encucar e desandar. Lembro-me de ter me
concentrado nessa hora para entender onde a Melissa já estava. Senti arder. Mais
uma contração forte, senti meu corpo tremer e escutei a Silvia: Nasceu!
Peguei-a das
mãos da Silvia e aconcheguei no meu peito. Abracei. Olhei os detalhes daquele
corpinho todo molhado e quentinho. Comemorei muito! “Filhaaa, nós conseguimos!!
Amor, ela é perfeita!! Filha, você é linda! Seja bem-vinda, Melissa!!” Era segunda-feira, 1h33 do dia 25/05/2015.
O parto
perfeito. O sonho realizado.
Naquele momento
eu me sentia muito forte. Poderosa. Estava em estado de graça por ter realizado
meu sonho. Viver esse parto era um desejo antigo e foi uma experiência incrível.
Mas também teria suas surpresas.
Sem saber
quando terminou minha comemoração, acordei deitada no chão com as pernas
elevadas. Desmaiei. Acordei com a Silvia massageando meu abdômen e fazendo a
dequitação da placenta. A Melissa foi levada para exames nessa hora. Senti um pouco de cólica, frio e cansaço, mas
pra mim estava tudo bem!! Tentei levantar e desmaiei de novo. Fiquei apagada
alguns segundos e acordei. A Silvia pediu para que eu não fizesse nenhum
esforço e que eles me carregariam. Fui colocada na maca e fui para a sala de
observação.
Eu estava muito
feliz!! A Melissa chegou e mamou super bem. Nasceu com 3235g e 49cm e apgar
9/10. Ficamos conversando e comemorando enquanto preparavam o quarto. A Sílvia
acompanhava meus sinais vitais com bastante frequência e observava o
sangramento.
O quarto ficou pronto e fomos pra
lá. Minhas filhas e minha mãe entraram para ver a Melissa. Eu estava tão feliz
pensando em tudo que havia passado naquele dia; que apesar da dor intensa eu
tinha realizado meu sonho e ia sair dali rapidinho, receber visitas, andar, me
sentir inteira, contar e recontar meu parto pra todo mundo!!
Mas a Sílvia
pediu pra que minha mãe levasse as crianças para descansar. Quando saíram do
quarto ela conversou comigo. Meu sangramento já tinha se estendido e que ela
precisava fazer um exame e ver se meu útero não tinha rompido. Me lembro de
perguntar se já não havia mais nada que pudesse ser feito. Ela disse que não e
eu disse: - Então, faça o que precisar fazer! Ela conversou com o Wender(esposo)
e me levou para o centro cirúrgico. Tomei uma raqui para fazer o exame. Meu útero rompeu.
Eu estava
tranquila e não sentia dores. Às vezes, sentia enjoos. Como eu já conhecia a cirurgia - que é como
uma cesárea- e já tinha tido meu parto, isso não era um problema. Fomos para a
sala de cirurgia e comecei a sentir a tensão no ar. A Silvia, com muita
serenidade, me tranquilizava. Em um determinado momento a vi com olhar fixo
como se tivesse se concentrando para a batalha...Perguntei do meu útero e ela
me disse que daria tudo certo! Na verdade, eu queria dar o aval se ela
precisasse fazer uma histerectomia.
Tomei anestesia
geral para essa cirurgia. Houve um desconforto no rosto e eu dormi. Quando acordei
minha obstetra disse que iria me colocar na UTI para que eu pudesse me
recuperar melhor e mais rápido e que faria de tudo para que eu ficasse lá só o
tempo necessário. Eram mais ou menos, 6 da manhã. Eu pensei em 12 horas, o
médico da UTI em 24. Na minha cabeça ainda estava tudo bem, como eu falei, eu
estava em estado de graça!
Mas na verdade,
nada disso é o que pensamos quando escolhemos um Parto Humanizado. Além da via,
você quer o contato imediato, quer parir sua placenta espontaneamente, quer o campleamento
tardio do cordão com todo ritual do pai da criança pra cortá-lo, quer amamentar,
quer tirar fotos da placenta, da equipe...
As horas na UTI
foram lentas; demoravam a passar. A equipe médica cuidava de mim com muita
dedicação e carinho. Em nenhum momento houve falta de respeito ou julgamento. O
cuidado de fato era intensivo. Só a posição era ruim. Tive de ficar deitada sem
nenhuma inclinação na cabeça e isso me incomodava bastante. Fiquei com muita
dor nas costas.
Foi necessário
fazer transfusão. Eu perdi muito sangue antes e durante a cirurgia. Minhas mãos
ficaram inchadas, minhas unhas estavam amarelas como se não tivessem uma gota
de sangue (literalmente). Toda hora tinham picadas e agulhadas para novos
exames. Fiquei com os braços roxos.
Recebi visitas.
Meu marido estava pálido de preocupação. Mas eu ainda tinha muita ocitocina. Em
nenhum momento pensei que sairia sem vida dali. Eu sei que não foi fácil pra
quem pôde me ver e também para a equipe. Foi um momento único para nos conectarmos
com Deus!
Recebi notícias
da Melissa. O pai ficava com ela no berçário. Ela chorava e não aceitava outro
leite. Eu já estava preocupada querendo amamenta-la. 24 horas depois tive alta.
Começou a preparação para me levarem para o quarto. Ao tentar levantar para
tomar banho, não consegui porque ainda me sentia fraca. Fui de cadeiras de
rodas com muita dor. Por causa do horário da liberação da UTI, até que consegui
voltar para o quarto foram 30 horas longe do meu “cute”.
Quando cheguei
no quarto, levaram a Melissa pra mim. Ela pegou o peito e mamou como se não
tivéssemos ficado separadas. Agora sim poderíamos ficar juntinhas. Como ela já
tinha ficado tempo demais longe de mim, as enfermeiras fizeram questão de
mantê-la comigo. Muito cuidadosas, fizeram de tudo para garantir meu conforto.
Comecei a receber visitas. Eu sou do tipo que quero contar tudo pra todo mundo
e já me sentia bem. Respondi todas as mensagens do whatsapp, mas notei que
minha cabeça começou a doer. Doía de uma maneira que nunca havia sentido. Meu
corpo tremia todo quando eu ficava um tempo em pé. O tempo de ir ao banheiro
fazer xixi era suficiente para sentir calafrios. Novos exames e um dos
resultados apontou anemia forte. A Dra Sílvia solicitou mais uma bolsa de sangue
para reforço enquanto tentava entender minha dor de cabeça. Essa dor era
esquisita. Só doía quando eu sentava ou levantava. Se estivesse deitada não
sentia nada. Isso me deixava irritada!! Por causa desta dor de cabeça e da
anemia fui ficando no hospital. Sempre fazendo novos exames e mais bolsa de sangue!
Meu sangramento começou a ficar ralinho, aguado. A Silvia ficou preocupada e
pediu pra fazer um novo exame. A suspeita era que pudesse ter perfurado minha
bexiga e ter uma comunicação com o útero. Passamos a sonda e, Graças a Deus,
foi só um susto. Tudo certo com isso, mas sinceramente, quanta provação!
Confesso que chorei. Pela primeira vez eu confessei pra mim mesma que não era
assim que eu tinha imaginado!! Não era assim que eu queria e não era assim que
eu sonhava!!
Mas a dor de
cabeça me irritava profundamente e após uma conversa com o anestesiologista
identificaram que eu estava com cefaleia pós-raqui. Gente, pensa numa dor terrível!
Eu preferiria mil partos a sentir essa dor de cabeça de novo!! Com o diagnóstico, também veio o alívio. Um
remédio certeiro foi indicado e as coisas começaram a se acertar. Antes, eu
cheguei a dizer que se fosse pra continuar com aquela dor eu queria ser dopada,
dormir até ela acabar, o que é previsto em 7 dias...
Depois disso o
quadro foi se estabilizando para eu ter alta. Já estava com muita vontade de ir
pra casa, para as minhas coisas, para minha família, para o meu ninho. Na
sexta-feira pela manhã, tive alta. Sem a dor de cabeça eu já estava boa de
novo. Cheguei em casa na sexta a tarde, descansei no sábado e no domingo
reunimos a família para, enfim, podermos comemorar a chegada da Melissa. E foi
uma festa!!
Com tudo isso,
aprendi que temos uma força enorme, que somos capazes! Merecemos ter
experiências assim! Merecemos assistência de boa qualidade!
Aprendi a confiar
no corpo e na mente. Pra mim, o parto está na nossa cabeça e à medida que
confiamos e aceitamos, ele flui melhor. A preparação para o parto é fundamental,
mas estar com uma equipe que acredita nos mesmos ideais é igualmente
importante. Todos precisam estar atentos e saber que providências tomar no caso
de uma intercorrência.
Aprendi que
Empoderamento é muito mais que ter certeza de que quer um parto
normal/natural/humanizado e lutar contra um sistema obstétrico obsoleto.
Empoderar-se é bem mais que ser a protagonista de seu parto e ter o direito de
parir com plenitude. É assumir risco. É ter consciência que você pode ser o
0,00001% da estatística e caindo nela, ainda ter forças para ver o lado bom de
toda história. É ter convicção que fez a melhor escolha. É ter saudade e se
emocionar com as lembranças!
Aprendi que não
importa o quanto a experiência foi diferente da desejada. Deus sempre esteve e
estará do nosso lado, independente do desfecho. Então, louvemos a Deus pelos
partos fáceis e pelos difíceis; Louvemos a Deus pelas intercorrências e pelos
riscos; Louvemos pela vida e lembremo-nos de que nem a morte poderá nos afastar
do amor de Deus!
Se
eu faria de novo? Claro que sim!!
Meus sinceros agradecimentos a toda equipe que me recebeu no
Hospital Santa Clara (Uberlândia-MG), em especial as enfermeiras Fernanda,
Alessandra, Carmem Santos e Carmem Lúcia, por terem ajudado a proporcionar o
melhor ambiente para o nascimento da minha filha.
Gratidão eterna à minha obstetra Dra. Sílvia Caires, à minha
amiga e doula Kelly Mamede e à minha família por terem me apoiado e acompanhado
neste sonho! Amo vocês!
Lívia Bernardes
Olá, estou me mudando para Uberlândia até dezembro.
ResponderExcluirEstou a procura de um parto normal humanizado. Você poderia me passar contato de alguém. Estou de 5 meses. Esperando meu quarto filho Jordan. Meu terceiro , Gabriel nasceu em casa.
Meu face Katia Peres Alvares
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